Romã
Quando a mãe entrou na sala, viu a menina sentada perto da janela com a mãozinho no queixo, olhando pro pezinho de romã que a fina garoa lentamente cobria. A chuvinha ia fazendo coceguinhas nas suas tenras folhas e as deixando mais brilhantes diante dos últimos raios do dia que ia se acabando. A mãe foi entrando com cuidado, na ponta do pé, mais leve que uma pena, equilibrando a respiração com a quietude do momento. A menina nem olhou pra trás, coçou o nariz com as pontas dos dedos e continuou com o seu minucioso trabalho de observação - que bonito o meu pezinho de romã - pensou ela. E era mesmo um primor de plantinha, tão pequenininha e singela, a princesinha do quintal, mal tinha folhas e a menina já sonhava com as flores que viriam - Belíssimas certamente! - e logo depois os frutos vermelhos, suculentos, que ela colheria de vez em quando, para não deixar a plantinha chateada, porque todo mundo sabe que a planta sofre quando vê um de seus frutos partir. A mãe ficou lá por uns instantes, achando que o silêncio era naquela hora, o mais raro entre os cristais, que não deveria ser quebrado. Olhou para a filha por inteira: primeiro seu cabelinho escuro caindo pelos ombros, toda a sua pequenez de criança de quatro anos incompletos - Ah e as mãozinhas e os pezinhos, tão pequeninos, tão delicados, e a boquinha tão bem desenhada- pensou ela. E o amor pela filha lhe invadiu como uma onda, foi melhor, foi como o ar, que lhe cercava por inteira, e amou a sua menina, a sua criança, a sua filha que nascera dela mesma, daquele ventre, amou a filha como a amara quando ela abriu os olhinhos pela primeira vez, e o amor era tão grande que explodiu em forma de lágrimas silenciosas que lhe escorriam pelo rosto.
- Filhinha, a vovó morreu...
Foi assim como uma rápida inspiração depois de angustiantes momentos sem ar, que as palavras saíram da sua boca e levadas pelo ar como folhas secas, foram parar perto da janela. Como a garoa que cessava de cair lentamente lá fora, também lentamente a menina virou seus olhinhos para a mãe e sem dizer nada uma pra outra, ficaram como cúmplices, caladas, como se as duas soubessem a condição do silêncio- cristal.
- Acho que o pezinho de romã vai dá flor amanhã, a vovó me disse que não ia demorar...
A mãe se aproximou da menina e lhe apertou contra o peito, beijou o seu rosto uma, duas, muitas vezes e começou a lhe falar das flores, do sol e de como as romãs são gostosas de se comer na primavera.