sábado, 29 de maio de 2010

Retrato de Família

- Ah é ? E você acha que eu fiz esses filhos sozinha ? Na hora do prazer tá tudo muito bom né safado, mas na hora de cuidar, neguinho sai andando! Pera aí, você vai aonde ? Vai me deixar aqui falando sozinha?

- Vou lá, comprar pão pra essas crianças mulher, não enche! Que inferno!

O som da porta batendo estremeceu a casa, a mulher temeu pelos vizinhos "Será que escutaram? Que vergonha". Fez-se silêncio. As crianças brincavam no chão quietinhas, nem um piu se ouvia. A mulher sentou no sofá, ligou a televisão, chorou no primeiro intervalo comercial.

- Que merda, é sempre assim, a gente trabalha o dia inteiro, a semana inteira, o mês inteiro, não tira férias, tem que engolir a merda que o patrão fala, e pra quê ? Pra chegar em casa e ter que ouvir reclamação porque a gente esqueceu de comprar pão? PÃO MEU DEUS? É pão que essa mulher quer, é pão que ela vai ter...

O homem acelerou o carro, sentiu o vento gostoso no rosto. " Como que um homem honesto, trabalhador tem que engolir reclamação? Nada disso!"
- Quando eu chegar em casa a mulher vai ouvir umas boas.

Um estrondo. "Ai Senhor, bati em alguma coisa!". E tinha mesmo alguma coisa no chão, um corpo em farrapos, sujo, barbudo, com a barriga pra cima, arfando. Procurando, com desespero, encher os pulmões de ar. O homem saiu do carro, foi chegando perto, e matou o sujeito com o olhar, quando eles se olharam foi o último suspiro do velho. O corpo no chão era sujo, maltratado, tinha metade do peso de uma pessoa normal. "Um cara fraco, não resistiu".

O homem voltou pro carro, pois a cabeça no volante, nenhuma alma viva passava. Estatelou os olhos, tentou chorar, estava seco, riu muito. Chorou.

"E agora ? Ai Senhor! Eu matei uma pessoa! Meu Deus, o que será da mulher e das minhas criazinhas sem meu apoio? Vão crescer sem pai? E o escritório, eles não vão encontrar alguém que faça meu trabalho tão bem quanto eu".

Contou até dez, saiu do carro, jogou o indigente na beira da estrada " Mas também, esse bebâdo tinha que estar no meu caminho, que merda! Culpa do governo que não tira esses vagabundos da rua. Na verdade, eu to é fazendo um favor pra todo mundo. Gente desse tipo só ocupa espaço."

Acelerou o carro. Chegou em casa. Enfiou o carro de qualquer jeito na garagem. A mulher lá dentro tinha colocado as crianças pra dormir.

- Demorou tanto que seus filhos nem aguentaram, foram dormir só com o leitinho na barriga. Ei, to falando com você Cão, não tem dó não?

- Vou dormir, não me enche o saco.

Ela foi logo depois, se aconchegou perto do marido que a noite tava fria, pousou a cabeça no seu peito, ele beijou sua testa. " Pai igual a esse, meus filhos não iam encontrar" e dormiu, exausta.

O homem nunca tinha sonhado antes. Eram braços, pernas, cabeças fedendo a álcool, espalhadas pela rua no caminho pro trabalho. O chefe lhe chamava para uma conversa no escritório. Surpresa! O chefe era sua mulher e o mendigo estava morto, de barriga pra cima no meio da sala, arfando que nem um animal ferido.

Acordou suado, tomou um banho e saiu pro trabalho. Escolheu outro caminho, aquele que não dava pra padaria da noite passada. Não falou com ninguém. Almoçou qualquer coisa no buteco da esquina. Não deu conversa pro colega, pro dono da banca e nem pra bonitinha do primeiro andar. Foi pra casa direto.

- Oi querido. Está tudo bem ? Te achei tão abatido hoje de manhã ? Você não me conta nada mais.. Quando a gente casou você...

A mulher parou de falar. O telefone tocou.
- Alô! Quem? Ah, oi Dona Paulina, pode falar... Quem? Ah sim sim, sei sei.

O coração do homem foi a mil. " É a polícia". Se trancou no quarto, tirou o revólver de cima do armário. Apontou pra porta.

- Ah, que pena não? Ah, eu sabia né, dava pra sentir de longe. É... Que Deus o tenha.

Tremeu. Caiu no chão. O revólver sem bala foi parar longe.

- Vão bem graças a Deus. Ainda não, escola só ano que vem né. O menor tá com 5. Passa muito rápido mesmo. Tá bom então, obrigada viu Dona Paulina. Vou sim, não perco o sermão do padre por nada. Sim, sim. Boa noite, amém.

- Era a Dona Paulina benhê, tava contando que acharam o corpo daquele velhinho que vinha pedir pão amanhecido pelas redondezas. Parece que morreu do coração, tadinho. Você acredita que ele foi encontrado na beira da estrada. Pecado. Benhê? Oooo Bem, não tá vendo que eu to falando com você homem de Deus?

A mulher entrou no quarto, encontrou o marido com uma poça amarela em volta, fedendo. Colocou a cabeça dele no colo dela, sentiu o molhado quente no avental. Não falou mais nada. Ele chorou que nem uma criança por duas horas.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

domingo, 16 de maio de 2010

' Nature is a language - can't you read?
Nature is a language - can't you read?

So ask me, ask me, ask me
Ask me, ask me, ask me '

Ask - The Smiths

quarta-feira, 12 de maio de 2010

as vezes ficar as moscas faz bem:
bem pra você, bem para os outros,
bem para as moscas...
enfim, todo mundo feliz.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

the syndrome of normal love

are you leaving now, my Darling ?
are you leaving me now ?

don't you forget to take your coat, coz is cold out there
without my warm
take some of my heart too, so it can lead your way back home

when nobody is good enough for you
smelling the scent of other skins, tired of other mouths,
just disappointed with the outside,
cause Love, I know, you'r always unsatisfied.

go, go now
don't be shy
take your part of the world
and come back to teach me how to
love you once again.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Un Jour

- C'est ce que vous voulez?
- C'est ce que je pense que c'est mieux
- Mieux pour qui?
- Mieux pour nous deux

un jour, peut-être, ce que je veux sera ce qui est mieux pour nous...